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Adriana Calcanhotto inventa novo mundo para crianças em show em São Paulo

Fonte original: folha
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Enfim ela está de volta. As crianças unidas de todas as idades exigiram a transformação de Adriana Calcanhotto, de 60 anos, em Adriana Partimpim. Agora, mais de uma década depois, a demanda foi atendida. No próximo dia 1º, somos convidados a conhecer "O Quarto" da cantora, no espetáculo, em São Paulo, que integra a turnê do álbum de mesmo nome, lançado no ano passado. A brincadeira com as palavras se inicia aí: entrando no quarto onde Partimpim dorme, também ouvimos o repertório do seu quarto disco feito para crianças.

Antes de tudo, a gente precisa entender direitinho a mudança de sobrenome da artista. Partimpim não é uma personagem, mas um heterônimo, ou seja, o nome criado pela Adriana dos grandes, a Calcanhotto, para escrever canções com um estilo voltado ao público infantil. É um macete usado, ao longo da história, por poetas importantes, como aquele português Fernando Pessoa, para dar vazão a uma voz autoral. A artista diz, no entanto, que seu heterônimo guarda diferenças em relação à tradição literária portuguesa.

"Tem um enorme desafio aí, porque o heterônimo da poesia portuguesa é escrito, não é uma voz cantada. Quando você lê, você reconhece o estilo daquele heterônimo, mas com a voz gravada é diferente, o reconhecimento é difícil", diz Calcanhotto.

Talvez porque, em sua discografia para crianças, a artista trabalhe, na maioria das vezes, como intérprete de canções escritas por outros compositores, explorando múltiplas vozes. Do mesmo modo, a artista não procura encerrar Partimpim em uma identidade ficcional, o que seria característico de uma personagem.

"Isso de saber quem é a Partimpim não é tão importante. Tem uma coisa da imprensa que é perguntar se eu me preocupei com essa ou aquela questão. Partimpim não se preocupa com nada. Ela é uma criança e só se ocupa do presente", afirma a artista. Seus gostos, porém, ficam evidentes no palco: ela gosta de acumular tralhas e de fazer teatrinho, não apenas uma vez, mas de novo e de novo e de novo. Partimpim entende tudo isso como poesia.

"E nós vamos brincar juntos/ E nós vamos inventar o mundo/ E nós vamos ser cor, música e poesia/ E nós vamos ser bicho, planta, fantasia", diz um trecho de "O Meu Quarto", canção composta pelo heterônimo para o novo disco, que é tocada logo no início do espetáculo. O nosso gosto pela repetição está no uso reiterado da expressão "e nós vamos", um convite para a gente entrar na brincadeira.

"O Meu Quarto" sublinha a capacidade das crianças de inventar um mundo outro, que não o dos adultos, onde seria possível ser quem a gente quiser ser —"bicho, planta, fantasia". O sentido de invenção está presente desde o início do espetáculo, quando Partimpim surge em cena.

Ela aparece vestindo um capacete de astronauta, indicando o caminho do novo mundo. A cada canção, Partimpim muda o capacete, que contém nele diversos objetos, a depender de letra e melodia. Em "As Borboletas", de Vinicius de Moraes e Cid Campos, várias borboletas rondam a cabeça da inventora. O quarto de Partimpim, é verdade, esconde muitos segredos.

Assinado por Daniela Thomas, o cenário da turnê se configura a partir de telões, um deles sugerindo a forma de uma cama, onde a cantora se deita com a sua mantinha colorida. O teatrinho, porém, se faz nas traquitanas que se espalham no palco, entre as quais uma cadeira de balanço adornada por flores e uma bateria de plástico, que ela toca. No palco, tudo se harmoniza na paleta de cores de Mestre Jasson, um artesão do sertão alagoano.

Calcanhotto iniciou o projeto "Partimpim" há duas décadas, com a proposta de oferecer uma alternativa às crianças que, segundo conta, eram obrigadas a ouvir um tipo de música que subestimava a inteligência delas. Na infância, a artista era chamada de Partimpim por seu pai, então esse pareceu ser o nome ideal para o heterônimo.

O espetáculo de agora mobiliza as canções dos quatro álbuns —"Canção da Falsa Tartaruga", "Ser de Sagitário", "Boitatá", "to bem", "Lindo Lago do Amor" e "Gatinha Manhosa". É importante a gente prestar atenção na última música, "Bim Bom", de João Gilberto, um dos inventores da bossa nova.

Nela, Partimpim canta os famosos versos "é só isso meu baião/E não tem mais nada, não", sugerindo que, mesmo sendo acumuladora, sua brincadeira, a poesia, continua sendo marcada pela lapidação dos seus brinquedos —palavra, música, bateria de plástico, capacetes— e pela simplicidade com que administra o excesso de traquitanas em cena. É bem verdade que, dessa vez, Partimpim tem a ajuda de uma dupla de contrarregras que participa do espetáculo. Jorge Ribeiro e França montam e desmontam a cena, usando, eles também, capacetes biônicos.

Para Calcanhotto, seu heterônimo serve como um laboratório de sons. O importante, diz ela, é se divertir com a música, assim como o multi-instrumentista Hermeto Pascoal, morto no mês passado, fazia com brinquedos. A dupla se uniu em estúdio, no fim dos anos 1990, para gravar "Canção Por Acaso", obra feita pela Adriana dos grandes.

"Eu entendi aquilo como uma coisa que uma criança faria. Era experimentação lúdica e tinha a ver com o meu desejo de um dia fazer uma discografia para crianças", diz a cantora. Mas pera lá! O show Partimpim nada tem de infantilizado. Em seu projeto, Calcanhotto questiona o que entendemos por infância.

Não se trata de um lugar perdido no passado, mas de uma promessa de invenção que se localiza no futuro. A gente percebe que essa coisa de "oh! Que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida/ Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais" é um papo furado que a escola ensina.

Na discografia de Partimpim, lidamos até com a morte, que não é o momento em que viramos estrelinha. No fundo, o que é "Fico Assim Sem Você" senão uma canção sobre a morte? Maior sucesso comercial de Partimpim, a composição de Cacá Moraes e Abdullah, gravada em 2002 por Claudinho e Buchecha, tematiza o instante em que a gente perde quem a gente ama, separando pares tão inseparáveis quanto os autores. Naquele mesmo ano, Claudinho deixou Buchecha sozinho, morto em um desastre de automóvel.

Os adultos, tão inocentes, acham que a fofura de "piu-piu sem frajola" e "queijo sem goiabada" é só fofura. Nada disso! É muito mais, é a ausência do "sem" repetido várias vezes até ser elaborado e se transformar nas imagens poéticas. Talvez por isso a canção faça tanto sucesso. Essa transformação está prevista em uma pergunta contida na mesma letra: "por que é que tem que ser assim?".

É uma questão que as crianças e os poetas fazem de novo e de novo e de novo. "A relação entre poesia e infância é um ouvido livre. A poesia entra no ouvido de uma criança com muito mais potência. Eu me sinto um pouco obrigada a botar crianças para ouvir grandes poetas", afirma Calcanhotto.

Somente com o ouvido livre torna-se possível dar a volta por cima, mesmo quando a gente fica triste. E essa volta por cima acontece, como uma mágica, toda vez que a gente canta junto a letra de "Também Vocês": "Nunca dizer nunca/ Cair, levantar/ Ver com olhos novos/ se maravilhar."

O jornalista viajou a convite do festival Doce Maravilha

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